segunda-feira, 29 de setembro de 2014

"O Deus abandona António"


 

O Deus abandona António

Quando bruscamente, nas trevas da noite,
ouvires passar o tropel invisivel das vozes puras,
o coro celeste das sublimes hamonias,
abandonado definitivamente pela fortuna, desfeita em pó as ultimas esperanças,
esvaida em fumo uma vida de desejo
Ah! não sucumbas lastimando um passado
que te traiu,
mas como um homem que se prepara há muito tempo,
despede-te corajosamente
de Alexandria que te abandona.
E que a tua vida já não vale nada,
nem que vás procura~la nos confins da Terra?
Não te deixes iludir e não digas
que foi um sonho, um logro dos teus sentidos.
Deixa as suplicas e os lamentos para os poltrões
Abandona vãs esperanças
E como um homem que se prepara há muito tempo
Resignado, altivo, como compete a uma cidade como esta
abre a janela
olha para a rua e bebe a taça inteira de amargura
e a derradeira embriaguez da multidão mística
e despede-te de Alexandria que te abandona.

Lawrence DURREL,
O Quarteto de Alexandria 1, Justine


Sem comentários:

Enviar um comentário