domingo, 11 de maio de 2014

Homem do campo na cidade




Pintura: De costas para nós, René, o irmão mais novo do pintor Custave Caillebotte, nascido em Paris em 1848 e falecido na mesma cidade em 1894, olha de uma janela da casa da família, no nº 77 da rua Miromesnil, em Paris.A balaustrada cria uma divisão entre o interior da casa e o mundo exterior, levando o nosso olhar a seguir o de René. O artifício de atrair o observador ao quadro através da vista emoldurada pelo caixilho da janela torna esta imagem numa das obras de maior fascínio de Caillebotte.Este especializou-se em vistas da cidade de Paris e arredores, bem como em cenas da vida das classes trabalhadoras.Amigo íntimo e admirador da ao obra de Monet, Renoir e Sisley, Caillebotte deixou em testamento ao Estado francês a sua colecção, da qual faziam parte 65 quadros de Impressionistas.



Ninguém vive sem passado. 
Todos temos memória, lembranças, boas ou más. Todos temos. Mas ele não tivera durante quase metade da sua vida A sua memória de emoções tinha-a construído. Os dias sobrepuseram sombras e tomado o lugar de figuras,  sem rosto. Paisagens desprovidas de contorno. Ideias que não sobreviviam ao tempo.
Das gentes, da família, tudo pequenas peças esquecidas na continuação dos anos a que, por ausência de palavras reais, também foram fazendo parte da mesma  neblina.
Episódios felizes só os que construíra com a imaginação. As férias que  durante o período de ausência às aulas inventava, tinham sido criadas de forma tão perfeita que se conseguira convencer de serem verdadeiras. A praia,  a família os amigos, o sol, o campo e as gargalhadas- tudo inventado O calendário vai deixando cair as suas folhas e a passagem do tempo juntou-o às leituras que foram surgindo como único consolo para a sua vida deserta. As personagens tornaram-se cada vez mais escassas. 
Muitos anos passaram sobre essas não-vivências. Hoje tem dificuldade em recuar a esse pensamento mas já é capaz de perceber a importância dessas “mentiras” que só a si próprio serviram. Percebeu finalmente que nunca quis ver-se por dentro. Ambicionou ter uma vida igual aos intervenientes das revistas e do cinema, não a sua vida.
Hoje, que alcançou a oitava década da vida,  consegue-se quase verdadeiro.  Perdoou-se. Aprendeu a gostar  dos dias que a si próprio dedica. Aprendeu a conviver consigo, quando os amigos - poucos-  não invadem o seu mundomas aprendeu sobretudo a  aturar-se nas atitudes insubmissas, nos comportamentos indomáveis dos sonhos por realizar.
Deixou finalmente de ser o seu “sonho”. Percebeu-se em “espelho” nas outras pessoas. Tem defeitos e virtudes, físicas e morais, que reconhece, mas agora está entregue a si próprio por inteiro. A vida cumpre-se quando se vive de facto. Precisou de coragem para perceber e mudar. Criou a humildade de “conhecer” e “perceber” coisas tão importantes como a si mesmo.

LR/2014

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