Depois de uma conversa sobre Arte
e Escritores do Séc. XIX veio-me à memória o romance de Júlio Dinis, “Uma Família Inglesa”
e tentei-me a descobri-lo, para o reler, no meio dos livros que tenho na estante.
De facto lá estava num canto, escondido por outros novos romances, com
algum pó, mas pronto
para consumir . Essa é uma das muitas vantagens de ser livro Mas isto
são comentários laterais, porque tive e tenho no livro um grande amigo. Adiante.
Li-o com uma avidez que há muito
não sentia e não resisto hoje a traçar
uma pequena dissertação permitindo-me a veleidade de despertar em alguém, igual
apetite por ler, ou reler, um livro que, apesar de distante no tempo é ainda
tão actual. Com uma estrutura romanesca bem ao jeito da época, Júlio Dinis faz
neste romance descrições singulares dos personagens, bem como de algumas zonas
da cidade do Porto.
Uma família tradicional inglesa,
vivendo no Porto em finais do Séc.: XIX, onde o patriarca Whitestone tem um
escritório de transacções comerciais.
Família composta por pai e dois
filhos, Jenny e Carlos, que ao longo de toda a narrativa vão evoluindo
paralelamente com Manuel Quintino, o guarda-livros da família, e Cecília, sua
filha, que enamorada de Carlos com ele acabará por casar com a bênção dos pais
de ambos e a protecção incondicional de Jenny.
Uma família Inglesa é, de todos
os romances do autor o que menos se refere aos problemas sociais da época, em
crise de transformação
No entanto no capítulo em que se
caracteriza Cecília como “… portuguesa perfeita…”, é o momento escolhido por
Júlio Dinis para acentuar o facto de nunca valorizarmos o que é nacional
colocando-nos sempre e relativamente aos estrangeiros em posição desvantajosa. Surge
um problema com a diferenciação de classes entre Manuel Quintino e Whitestone.
Resolve-se no entanto com a elevação social daquele a sócio deste. A diferença
religiosa também mereceu do autor desenvolvimento, já que tal atitude poderia
provocar um desenlace diferente do preconizado por Júlio Dinis.
Ao longo de todo o romance as
cenas evoluem em diferentes espaços físicos, embora equivalentes em importância
quanto ao desenrolar da acção. Entre o escritório e o domicílio dos Whitestone
viaja-se num Porto exterior, cidade comercial de grande agitação, que
acentuadamente contrasta com a área da casa, do ambiente privado, da família.
Na residência de Mr. Richard
Whitestone, família de tradição aristocrática, o gosto apresenta-se como
marcadamente britânico, nos comportamentos “… veja como dobrou esse
guardanapo…” e na forma de vestir “… fraque de pano azul, fabricado nas
melhores oficinas do Yorkshire ou do West of England…”
Do ponto de vista do leitor será
sempre necessário estabelecer num contexto mais vasto a informação da época do
autor e da própria narrativa. Todavia reler esta ficção é voltar ao tempo em
que os dias ainda tinham uma luz própria e uma duração muito longa. Não deixe
de espreitar a sua estante e se ainda lá estiver este magnífico romance pegue
nele. Nem que seja só para voltar a sentir os dias longos.
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